Ministro francês quer mais estrangeiros nas universidades do país

"Mudamos tudo", afirma o ministro da Educação Superior e Pesquisa da França, Laurent Wauquiez, sobre a reforma iniciada em 2007 no seu sistema universitário.

O "tudo" significa que agora as instituições têm liberdade para definir o perfil de seus docentes, fazer seus planos pedagógicos e escolher a cor de suas paredes, exemplo que o ministro reiteradamente repete para mostrar como era a centralização do sistema antes da reforma.

Outras mudanças promovidas foram a integração das instituições de ensino superior (as universidades, as escolas de elite chamadas Grandes Escolas e os centros isolados), a aproximação delas do mercado e o aumento do investimento para sua modernização --foram liberados algo em torno de 22 bilhões de euros.

Tudo isso para melhorar a competitividade de suas escolas: a França possui apenas 5 entre as 200 melhores do mundo, ante 32 do Reino Unido, segundo o ranking global de universidades Times Higher Education.

Buscam também aumentar a atratividade para alunos e pesquisadores do mundo todo.

A mudança está em curso, mas já trouxe melhorias para estudantes estrangeiros, segundo Alexandrine Brami, diretora do Instituto de Estudos Franceses e Europeus de São Paulo, que auxilia e presta consultoria a estudantes brasileiros que querem estudar na França.

"Uma das principais vantagens foi a simplificação do sistema. Antes, eram tantas siglas que nem nós franceses entendíamos. Agora, existe apenas graduação, mestrado e doutorado", disse.

Por outro lado, a reforma ainda possui problemas, diz a presidente da universidade francesa Cergy-Pontoise, Françoise Moulin Civil. "Os recursos aumentaram bastante. Mas não tem sido fácil integrar instituições. Nós, por exemplo, tivemos trabalho para poder usar um laboratório de pesquisa na região."

A seguir, trechos da entrevista que o ministro da Educação Superior concedeu à Folha, no mês passado, em que ele explica mais sobre a reforma em curso.

Por que a França decidiu fazer a reforma? Quais eram os pontos mais fracos do sistema?

Desde 2007 empreendemos um movimento de reformas sem precedentes em nossas universidades. A excelência acadêmica estava ali, mas faltava reforçar sua atratividade, a profissionalização dos estudos e dar os meios a nossos centros para se tornarem mais competitivos internacionalmente.

O principal problema do sistema francês era sua excessiva centralização. Antes de 2007, tudo se decidia em Paris, a contratação de professores, a reforma de prédios e até a escolha da cor das paredes dos edifícios! Essa centralização causava atrasos e impactava na qualidade de ensino. Além disso, cada universidade estava apenas focada em seus temas, o que era um grande inconveniente em uma competição global que nos impõem combinar conhecimentos.

Além de tudo isso, as universidades não tinham relação com as empresas.

Como funciona essa descentralização?

Os recursos humanos e financeiros, mobiliário, sistemas de informação, projetos escolares, são agora geridos mais perto das demandas de cada região. Temos dado às universidades meios para conseguir esses objetivos com um aumento de 23% da média de recursos para funcionamento entre 2007 e 2011.

A existência de uma relação entre universidades e empresas é um debate complexo no Brasil. Como vocês lidam com isso?

Devemos desenvolver a sinergia entre o mundo universitário e o mercado do trabalho. Com a reforma, abrimos nossas universidades ao mundo da economia e das empresas. As ofertas de formação são definidas de acordo com as necessidades do tecido econômico local da universidade.

Também criamos 41 fundações comuns entre a educação superior e as empresas, as redes bancárias, a comunidade local e as redes de ex-alunos.

Quais são as principais dificuldades que vocês vêm enfrentando?

Como toda grande reforma, houve resistências e tensões. Há quatro anos, julgávamos essa reforma impensável. Todos concordavam sobre a necessidade dela, mas ninguém teve coragem de fazê-la. Hoje, ninguém na França questiona a autonomia universitária.

Outra dificuldade é a complexidade do processo. Esta reforma é de magnitude sem precedentes na educação superior. Tomemos como exemplo a Operação Campus, de reformas físicas, ao qual destinamos 5 bilhões de euros, com 120 projetos em 2012. São operações de grande alcance que abrangem áreas de 40 a 260 hectares.

Mas a mudança está em curso. Em 1o de janeiro, quase toda a totalidade de universidades e centros de educação superior serão autônomos.

A crise econômica pode causar cortes nos investimentos?

Considero que os investimentos de hoje serão o crescimento de amanhã. Por isso, a crise não deve ser um freio ao investimento em educação e pesquisas. As medidas que tomamos ocorreram em um contexto de gestão rigorosa do gasto público. O orçamento das universidades e das pesquisas são prioritárias ao governo. Investiremos 22 bilhões de euros na educação superior. É a escolha política mais forte que temos feito durante a crise.

Haverá mais oferta de cursos em inglês? Isso não aumentaria o interesse de alunos estrangeiros?

Há muitos anos estamos tomando medidas para favorecer a utilização de línguas estrangeiras nos cursos. Para o período 2011-2012, propusemos 648 programas inteiramente ou parcialmente em inglês e uma dezena em espanhol.

A integração mundial das nossas universidades é uma das minhas prioridades. França hoje é o terceiro [caiu para quarto recentemente] destino mais escolhido por estrangeiros, e acolhe mais de 218 mil alunos internacionais.

A reforma parece uma grande mudança de mentalidade também...

A política de modernização significou diversas mudanças. Entretanto, soubemos preservar especificidades das universidades francesas, como o princípio da equidade social, a quase gratuidade dos estudos --as matrículas nas universidades francesas estão entre as mais baixas da OCDE-- e a igualdade de acesso.

Aumentou o número de alunos brasileiros em seu país após o início da reforma?

A França segue atraindo um grande número de alunos estrangeiros: 218 mil em 2010-2011, aumento de 2% em um ano, dos quais 26 mil são do doutorado e 95 mil do mestrado (master).

Os países que mais possuem alunos estrangeiros aqui são Marrocos (22 mil), China (20 mil), Argélia (20 mil) e Tunísia (10 mil).

Em vez de concentrar em mobilidade individual, priorizamos parcerias com países para minimizar os riscos de insucessos.

Esse esforço vai ficar mais considerável a partir de 1o janeiro de 2012, a partir das atividades do Campus France.

FÁBIO TAKAHASHI ENVIADO ESPECIAL À FRANÇA

Fonte - Folha.com

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